"As paixões humanas pareciam dever morrer aos pés daquelas grandes árvores que protegiam semelhante asilo dos ruídos do mundo e o retemperavam dos ardores do Sol.
— Mas que desordem! — disse o senhor d'Albon de si para consigo, depois de apreciar a sombria expressão que as ruínas imprimiam àquela paisagem como que fulminada por uma maldição.
Dir-se-ia um local funesto abandonado pelos homens. Por toda a parte a hera estendia os seus nervos tortuosos e as suas ricas roupagens. Musgos castanhos, esverdeados, amarelos ou vermelhos espalhavam o seu colorido romântico pelas árvores, pelos bancos, pelos telhados, pelas pedras. As janelas carcomidas estavam meio consumidas pelas chuvas, devoradas pelo tempo; as varandas quebradas, os terraços demolidos.
Algumas das persianas pendiam suspensas apenas de uma só dobradiça. As portas desconjuntadas não pareciam poder resistir a qualquer assalto. Sobrecarregadas de tufos refulgentes de visco, os ramos das árvores frutíferas, abandonadas, estendiam-se até muito longe sem frutos. Altas árvores erguiam-se no meio das avenidas. Semelhantes destroços imprimiam ao quadro efeitos de uma poesia empolgante e na alma do espectador ideias sonhadoras. Um poeta teria ali ficado por muito tempo absorto numa longa tristeza, admirando aquela desordem cheia de harmonias, aquelas ruínas a que não faltava a graça. Nessa altura alguns raios de Sol romperam as fendas das nuvens e iluminaram de raios de mil cores a cena meio selvagem. As telhas acastanhadas resplandeceram, os musgos brilharam, sombras fantásticas se agitaram ao longo dos prados, debaixo das árvores; cores mortas despertaram, oposições picantes digladiaram-se, as folhas recortaram-se na claridade. De súbito, porem, a luz desapareceu. Aquela paisagem, que parecia ter falado, calou-se, e tornou a ser sombria, ou antes suave, como o mais doce colorido de um crepúsculo de Outono."
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