"Ao chegar a orla do bosque, onde eu encontrara a carta e onde acabava o caminho de greda, parou, de repente, cansada, e disse, com uma voz que me partiu a alma, tão triste e desesperada soava, que se sentia mal e queria voltar. Mas ainda mal tínhamos chegado de novo ao jardim, quando voltou a parar e ficou com o olhar perdido no vazio. Triste e doloroso sorriso lhe crispou os lábios, e, como fatigada por um esgotamento completo, disposta a tudo quanto pudesse cair sobre ela, encaminhou-se, outra vez silenciosamente, para o bosque, sem me dirigir uma só palavra nem reparar tão pouco na minha presença...
Tive, de repente, uma feliz ideia; havia encontrado o meio de a salvar sem ela perceber.
— Vou cortar-lhe umas flores... Não gosta delas? — perguntei-lhe com uma voz tão alegre que ela levantou os olhos e fitou-me.
Rapidamente fiz um grande ramo, que rodeei de ervas finas e cheirosas, pondo, entre as melhores a carta. Mas ela olhou tão distraída as flores que ate parecia esquecida de que eu as reunira para sua exclusiva homenagem. Levantou maquinalmente a mão, tomou o ramo e colocou-o ao lado. E voltou a ler o livro que a acompanhava nos seus passeios. Fingi dormir. Apareceu uma borboleta e um besoiro. Eu continuava a dormir como um selvagem. Então, Madame M. agitou o ramo para me defender e, com grande assombro seu, saltou a carta que logo reconheceu e abriu. Leu e releu. Por fim, dissimuladamente, abri os olhos. Ela lia a carta, e as suas róseas faces e brilhantes olhos estavam húmidos de lágrimas; finalmente, ao concluir, na doce harmonia do seu semblante vi que regressava a vida.
De repente, ouvi chamar. E, não longe de nos, soaram vozes:
— Madame M.! Natália! Natália!
Ela não respondeu. Aproximou-se de mim, porem, e senti lágrimas ardentes e um beijo de doce gratidão na minha mão. Depois, beijou-a novamente.
— Natália!! Natália! Onde estas?
— Já vou! — respondeu Madame M., com a voz suave, que o pranto tanto quebrantara, e que só eu ouvi.
Deixara o seu lencinho de seda sobre o meu rosto. Beijos sem conta lhe dei, louco de alegria. Naquele instante, terminou a minha infância.
Quando, duas horas depois, voltei a casa, já Madame M. não estava entre os convidados. Acompanhada do marido, partira para Moscovo, onde os chamara, segundo diziam, uma noticia inesperada. Desde então, nunca mais voltei a vê-la."
O Pequeno Heroi, Fiódor Mikhailovich Dostoiévski, escritor
1 comentário:
Gosto destas coisas belas;)
Enviar um comentário